“O próximo bilhão de usuários” e semiótica em interfaces digitais

A Google¹ estima que, entre 2020 e 2025, aproximadamente 1 bilhão de pessoas irão começar a usar a internet. Sua interface está preparada para esses usuários?

Designando
5 min readMay 25, 2023

Me deparei com esse temática ao longo do curso de UX da Google no Coursera. “The Next Billion Users” — pessoas de países como Brasil, Nigéria, China e Indonésia, que estariam usando a internet pela primeira vez, majoritariamente por celulares.

O Skeuomorphism e o “treinamento” digital

E por que você deveria se preocupar com isso?

Bem, entre os anos de 2000 e 2015, aproximadamente, estávamos vivendo a evolução dos celulares. As interfaces precisavam ser muito intuitivas, pois estávamos aprendendo como elas funcionavam e como utilizá-las. Aqui a maioria das interfaces eram feitas de acordo com uma tendência estética chamada “skeuomorphism”.

Skeuomorphism é uma tendência, na qual os “ícones” nas interfaces se assemelham aos objetos, que visam representar, no mundo físico

Durante esse período, a metáfora visual feita entre o “ícone” na interface e o objeto no mundo físico era mais presente. Exemplo: o “ícone” do calendário parecia um calendário de parede norte americano. O “ícone” da câmera parecia um obturador de uma câmera, e por ai vai.

O Flat Design e o término do “treinamento”

Porém, chegou um momento no qual fomos considerados “treinados” — sabíamos o que a maioria dos “ícones” na interface significavam — , e as interfaces começaram a ficar mais limpas, mais bonitas: veio a tendência do Flat Design.

Skeuomorphism x Flat Design no iOS 6 (esquerda) e iOS 7 (direita) Fonte: https://www.businessinsider.com/ios-6-versus-ios-7-apps-2013-9#the-home-screen-2 <acesso em 23/05/2023>

Explicando melhor, no skeuomorphism existiam mais affordances, as quais:

“[…] se refere[m] às propriedades percebidas e reais de um objeto, principalmente as fundamentais que determinam de que maneira o objeto pode ser usado.” (NORMAN, 2006, p.33)

Pode-se dizer que a ideia era associar as características (as quais dão dicas de uso) dos objetos do mundo físico e transportá-las para o mundo digital.

Com o Flat Design, essas dicas “somem” e ficamos somente com o formato dos objetos para nos dar as dicas de “o que vai acontecer quando clico aqui?” ou “quero fazer X, onde clico?”.

Ou seja, quem está entrando no mundo digital por agora — esses próximo bilhão de pessoas — , tem que navegar por interfaces que talvez não estejam preparadas para elas.

A semiótica

Entrando em um papo um pouco mais técnico: a relação entre o design visual e a semiótica.

Semiótica é o estudo dos signos, os quais são representações de objetos/coisas. Os signos podem ser divididos entre ícone, índice e símbolo. Para os propósitos desse artigo, vou focar somente na explicação de “ícone” e “símbolo”².

Ícone, na semiótica, é quando o signo tem relação com o seu objeto (a coisa que o signo visa representar) por meio de semelhança de qualidades (cheiro, cor, forma, entre outros). Exemplo: quando uma nuvem lembra um animal, por causa da semelhança de forma entre eles.

Símbolo é quando o signo faz relação com o seu objeto devido à uma convenção (uma lei). Exemplo: a cor vermelho, a depender do contexto, pode significar diferentes coisas, como atenção, amor, paixão, algo negativo, entre outros.

A semiótica nas interfaces digitais

Vamos analisar a relação que existe entre o símbolo de uma engrenagem na interface e a ação de configuração:

Quando você modifica uma engrenagem em uma máquina, o que acontece? Muda o funcionamento do sistema. Máquinas existem há muito tempo e são utilizadas por muitas pessoas, essa associação é mais simples de se fazer.

Fonte: acervo próprio

Lembra que falei que passamos por um “treinamento digital” e que a maioria das coisas nas interfaces significam o que significam devido à convenção social? Bem, quando algo é uma convenção é necessário aprender aquilo, por isso o “treinamento”.

O que uma lupa faz no mundo físico? Ela faz com que coisas pequenas fiquem maiores — eis porque a forma da lupa era utilizada para representar o zoom (na verdade, ainda é). Porém, na maioria dos sites e aplicativos a lupa é utilizada também para representar a ação de “buscar”, “procurar”.

É necessário conhecer essa convenção para saber que: ao clicar na lupa, abrirá um campo de texto para você digitar o que está procurando e talvez achar aquilo.

Pessoalmente, eu acho que a associação entre a lupa e a ação de “achar coisas” veio pelo imaginário da figura do detetive procurando pistas segurando uma lupa (como Sherlock Holmes). O que vocês acham?

Coloque uma pessoa que NUNCA usou um aplicativo em contato com o seu: ela vai saber usar? Seu produto auxilia as pessoas a aprenderem as convenções e criarem repertório para fazerem as associações corretas?

Uma coisa que podemos fazer é utilizar textos para auxiliar as pessoas a aprenderem a associação entre forma e função — algo crucial no campo do design.

Illustration by Dani Grapevine from Ouch!

É isso, mais um texto sobre a aplicação dos conhecimentos do campo da semiótica nos campos de UI e UX Design. Adaptado diretamente das minhas 66 páginas de monografia 😅

O que vocês acharam? Deu para entender direitinho?

Como sempre, estou aberta à feedbacks e papos lá no meu Linkedin 😉

Notas

¹https://blog.google/intl/pt-br/novidades/iniciativas/novos-usuarios-de-internet-no-mundo-pos/ <acesso em 24/05/2023

²Caso queira entender mais sobre semiótica, recomendo a leitura do trabalho de Lucia Santaella

Referencial teórico

Recursos

Illustration by Dani Grapevine from Ouch!

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